Sanitarista da FIOCRUZ comenta o Plano de Convivência com a Covid-19

Texto: João Lucas Gama

Em meio ao atual cenário de flexibilização das medidas de isolamento social e o avanço do chamado “Plano de Convivência com a Covid-19”, implementado pelo Governo de Pernambuco, no dia 1º de junho, o Sindipetro PE/PB tem produzido uma série de matérias a respeito do tema.

Esta semana, nossa equipe de comunicação conversou com o sanitarista João Pedro Sobral Neto, biomédico especialista em Saúde Coletiva pelo Instituto Aggeu Magalhães (IAM/FIOCRUZ-PE) e mestrando em Saúde Pública também pela FIOCRUZ-PE, sobre as possíveis consequências e desdobramentos dessa retomada (precoce) das atividades econômicas no estado.

Leia, na íntegra, o conteúdo desta entrevista:

O governo de Pernambuco decretou uma medida de Lockdown em 5 municípios da Região Metropolitana do Recife, no último mês. Essa medida conseguiu obter certa efetividade em reduzir o número de novos infectados nessas cinco cidades, mas os índices de ocupação de leitos em UTI’s do Estado de Pernambuco permanecem com 96% de lotação e a mortalidade continua em alta no estado. Um dia após decretar o fim do lockdown, o governador anunciou um “Plano de Convivência com a Covid-19” para retomar as atividades econômicas em Pernambuco. O governo afirma que a doença está controlada. É possível atestar isso?
Apesar do lockdown ter aumentado os índices de isolamento social na RMR, não conseguimos atingir o índice de 70% de isolamento preconizado pela OMS e outros órgãos de saúde e, mesmo com, o governo estadual e prefeitura do Recife tendo implantado mais de 2000 leitos clínicos e de UTI na rede pública de saúde, ainda vemos uma grande quantidade de leitos ocupados, em especial os de UTI. No último domingo, a Secretaria Estadual de Saúde anunciou que a fila de espera por vagas em UTI foi zerada, o que, com certeza é um reflexo do lockdown, entretanto, ainda não podemos dizer que a doença está controlada. O que vemos hoje é uma diminuição da taxa de infecção, o que é diferente do controle da doença. Essa diminuição provoca uma tendência de estabilização da velocidade de transmissão, o que requer cuidados para que não haja um novo ciclo de aceleração descontrolada da transmissão da doença no estado.

Em sua opinião profissional, diante do atual cenário da doença no estado, o senhor considera que a retomada das atividades econômicas em Pernambuco, mesmo que escalonada, seja uma medida adequada, ou ela pode possibilitar um novo aumento no número de casos da Covid-19?
Particularmente, sou contra a retomada nesse momento. Acredito que neste momento deveríamos manter as medidas de isolamento, para que pudéssemos desacelerar ainda mais a velocidade de transmissão da doença em nosso estado. Contudo, sabemos que a retomada das atividades econômicas atende, em especial, aos grandes interesses econômicos do capital e à necessidade de o estado aumentar sua arrecadação tributária. A verdade é que, nunca houve uma paralisação das atividades econômicas, uma vez que, vários estabelecimentos comerciais não-essenciais burlaram a orientação de paralisação das atividades, muito devido à falta de medidas do governo federal para atenuação dos impactos econômicos para os Microempreendedores Individuais e as pequenas e médias empresas.
Como resultado desta retomada podemos, sim, ter um aumento do número de casos como vimos em outras cidades brasileiras e países.

O que poderia acontecer caso uma segunda onda de contágio ocorresse? O Sistema de Saúde em Pernambuco estaria preparado para contornar tal situação?
Em caso de uma segunda onda epidêmica, nosso sistema de saúde estaria mais preparado do que estava em março, haja visto que governos municipais e estadual ampliaram o número de estabelecimentos de saúde, de leitos e de profissionais. Não há como, neste momento, traçar um cenário de qual o impacto dessa hipotética segunda onda, mas podemos afirmar que é importante que as empresas e trabalhadores sigam os protocolos de retomada estabelecidos pelo governo do estado de Pernambuco e que, os empregadores disponibilizem equipamentos de proteção adequados e em quantidade suficiente para todos os trabalhadores.

Quais os grupos que primeiro seriam impactados com uma nova onda de contágio?
Os primeiros afetados seriam, com certeza, a classe trabalhadora moradora das periferias, predominantemente preta e pobre, pois é ela que estará exposta no transporte público, estabelecimentos comerciais e outros espaços que geram aglomeração. Por conseguinte, seus familiares, que estão em contato direto, uma vez que, devido ao grande déficit habitacional, habitam locais com pouco planejamento urbano e arquitetônico, impedindo a adoção de um isolamento dentro de seus domicílios. Há também o aumento do risco para profissionais de saúde de serviços que se encontram fechados, trabalhadores do transporte público e comerciários, industriários, profissionais da educação e todos os profissionais de nível fundamental, médio e técnico que atuam em atividades indiretas nos serviços que serão afetados pela retomada das atividades.

Outros países já tomaram medidas de retomada das atividades econômicas e até escolares. O que difere o Brasil e, em especial o estado de Pernambuco, desses países?
A grande maioria dos países começou a retomar suas atividades econômicas quando o número de novos casos estava em tendência sustentada de queda, enquanto que, no Brasil, prefeitos e governadores estão tomando esta decisão quando chegamos numa tendência de estabilização da curva em seu pico, que não sabemos qual será sua duração, o que é um grande risco, pois não sabemos o efeito que isso terá para o surgimento de novos casos e aumento de óbitos daqui 15 ou 30 dias, por exemplo.

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